Uma resolução do Senado publicada nesta semana abriu brecha para que
pequenos traficantes possam cumprir penas alternativas, em vez de ficar na
prisão. O ato suspendeu um trecho da legislação de entorpecentes que proibia a
conversão do cumprimento de pena na cadeia nos casos de tráfico de drogas em
punições mais leves, como a prestação de serviços comunitários. A decisão foi
tomada a pedido do Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu que essa
proibição da troca de penas era inconstitucional.
Aprovada em 2006 pelo Congresso e envolta em polêmicas discussões, a lei
de entorpecentes ficou famosa por endurecer as punições a traficantes - a pena
mínima para o tráfico subiu de 3 para 5 anos, por exemplo - enquanto abrandava
as penas voltadas aos usuários de drogas.
O objetivo era combater o tráfico e, ao mesmo tempo, focar na
recuperação do usuário. A nova resolução, porém, relativiza essas diferenças,
permitindo que pequenos traficantes que sejam réus primários com bons
antecedentes e não tenham vínculos comprovados com organizações criminosas
também possam prestar serviços comunitários, de acordo com o julgamento de cada
caso.
O STF já havia decidido em alguns casos que penas alternativas poderiam
ser aplicadas aos traficantes - o entendimento é de que a Convenção Contra o
Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, ratificada
pelo Brasil em 1991, é de hierarquia superior à lei e permite a adoção de
sanções mais brandas. Agora que a resolução do Senado foi editada, todos os
juízes estão obrigados a seguir esse entendimento - o que causou polêmica entre
juristas, advogados e magistrados. 'Isso é um desserviço ao combate ao tráfico.
Estamos vivendo uma situação muito difícil, porque as penas restritivas de
direitos são extremamente benevolentes', afirma o desembargador do Tribunal de
Justiça de São Paulo José Damião Cogan.
Segundo ele, a possibilidade de reduzir a pena de traficantes não é
necessariamente ruim, mas deve ser usada com 'parcimônia'. 'Conheço dois ou
três juízes que aplicam penas mínimas sempre, não só em casos excepcionais.
Vedar as penas restritivas foi longe demais. Acho que, do jeito que as coisas
estão crescendo no Brasil, com droga a gente não pode brincar.'
Liberais. Advogados e juristas que defendem a diminuição das prisões por
causa de crimes mais leves, por outro lado, são favoráveis à mudança. 'Defendo
plenamente a conversão da pena em casos específicos. Quando são pequenas
quantidades de drogas e não se trata de um traficante conhecido ou que tenha
tido condenações reiteradas, a pena alternativa de prestar serviços à
comunidade acaba sendo mais útil tanto ao próprio condenado quanto à
sociedade', rebate o advogado criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira.
Para ele, a pena de prisão deve ser exclusiva para quem causa graves
riscos à sociedade. 'A prisão pode ser uma escola do crime para pequenos
traficantes sem antecedentes.'
O Brasil já teve três leis específicas voltadas ao combate das drogas.
As primeiras proibições, na década de 1960, foram feitas com base no tratado
internacional discutido na Organização das Nações Unidas (ONU) - e tornaram
ilícitas as substâncias psicoativas que não tivessem uso médico.
A primeira lei brasileira foi sancionada em 1976, mas foi revista no
início deste século. Em 2002, nova lei foi aprovada pelo Congresso, mas o veto
presidencial aos crimes tipificados levou a uma discussão que resultou na atual
legislação, em vigor desde 2006. Ela mantém a criminalização do consumo, mas
sugere penas mais brandas para os usuários.
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